2. Manual brasileiro de Acreditação

Evolução do aprendizado

Na mesma época em que desenvolvia o Manual de Acreditação para América Latina e Caribe, a Organização Pan-
-Americana de Saúde (OPAS) realizou um levantamento em 15.000 hospitais da América Latina identificando o seu perfil e os principais desafios enfrentados. O cenário encontrado era heterogêneo. De um lado, existiam grandes centros médicos avançados. De outro, um grande número de instituições nas quais se encontrava baixa resolubilidade, ausência de mecanismos de controle e até mesmo falta de condições mínimas para prevenção de infecção hospitalar. De acordo com Humberto Novaes, uma “quantidade razoável” desses hospitais “não resistiria a uma mínima avaliação para garantir uma qualidade permanente em todos seus serviços”.¹

A realidade regional tornava ainda mais desafiador estabelecer padrões de qualidade que pudessem ser aplicados em diferentes perfis de hospitais. Para responder a essa questão, durante a elaboração de seu Manual de Acreditação, a OPAS contratou, em 1987, o argentino Itaes (Instituto Técnico para a Acreditação de Estabelecimentos de Saúde).

Nas discussões com o Itaes, a solução encontrada foi estabelecer “degraus” no processo de acreditação. O nível 1 seria uma marca de corte para atestar se a instituição tinha condições suficientes para oferecer assistência de qualidade ao paciente. O intuito era que os hospitais em nível 1 continuassem a aprimorar seus processos para alcançar a excelência, o nível 3.

Esperava-se que nenhum hospital de algum país que estivesse em um processo de acreditação se situasse abaixo deste nível [1], dentro de um período de 2 anos, por exemplo. À medida que estes padrões iniciais forem alcançados, o hospital vai procurar perseguir para o padrão seguinte, ou seja, quando o padrão de nível 1 é atingido, o passo seguinte é alcançar os níveis 2, 3 e assim, sucessivamente.¹

Outra questão levantada foi a necessidade de adaptar padrões e indicadores de qualidade específicos para os diferentes setores do hospital, mas sem perder a noção do todo. A OPAS definiu, então, que a acreditação se daria pela unidade hospitalar de forma integral, ou seja, um serviço não poderia ser acreditado se obtivesse na avaliação um item de forma isolada com nível 3 mas com demais ambientes que não preenchiam os requisitos necessários para o nível 1, por exemplo.

Para a realidade brasileira da época, a incorporação dessas fases no sistema de qualidade foram fundamentais para a aderência ao processo. Os manuais internacionais, por exemplo, não traziam classificação semelhante.

Em 1998, na primeira publicação do Manual Brasileiro de Acreditação, a classificação por níveis é mantida. Na segunda edição, após a aplicação do manual em 17 hospitais, foi excluído o nível 4, que estava presente no manual da OPAS. Foi aí que foram instituídos os conhecidos níveis: acreditado (ONA 1), acreditado pleno (ONA 2) e acreditado com excelência (ONA 3).

Fábio Leite Gastal, que na época pertencia ao grupo gaúcho que participou das discussões para a elaboração do manual, recorda que, ao elaborar a publicação, o grupo técnico teve a preocupação de adaptar os níveis do manual aos ensinamentos do professor Avedis Donabedian, autor reconhecido pelos estudos de qualidade em saúde. “O corpo técnico chegou a um acordo de que os níveis seriam orientados pela tríade de Donabedian”, explica. Assim, o nível 1, por exemplo, trataria da estrutura em um conceito abrangente que passa tanto pelo espaço físico como pelos recursos humanos, legislação, conformidade regulamentar, entre outros. O nível 2, além de incorporar as diretrizes preconizadas no nível anterior, adicionaria a verificação dos processos. Por último, o nível 3, além de atender aos requisitos anteriores, mostraria que a entidade conseguiu resultados diferenciados na assistência.

Ao longo dos anos, os padrões para o nível 1 preconizados na primeira versão do manual, em 1999, foram sendo incorporados aos hospitais. Hoje, as exigências para alcançar o nível 1 e os demais níveis são completamente diferentes do que há duas décadas.

Evolução dos manuais

Em 2001, é lançada a primeira publicação realizada pela ONA: o Manual das Organizações Prestadoras de Serviços Hospitalares/ Organização Nacional de Acreditação – ONA – Coleção Manual Brasileiro de Acreditação – Volume 1.

A partir de 2001, convênios firmados com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) demandaram que fossem elaborados padrões e manuais não só para hospitais, mas para outros tipos de estabelecimentos. “Uma das coisas que a área de serviços da Anvisa exigiu nos convênios foi que levássemos a metodologia de acreditação a outros serviços de saúde”, relembra Gastal.

CAPA DO PRIMEIRO Manual Brasileiro de Acreditação, lançado
em 1998.

A SEGUNDA EDIÇÃO do Manual Brasileiro de Acreditação Hospitalar foi lançada em 1999.

O MANUAL BRASILEIRO de Acreditação em sua versão 2002.

O MANUAL BRASILEIRO de Acreditação lançado em 2004.

Assim, em 2003, é lançado o Manual de Acreditação das Organizações Prestadoras de Serviço de Hemoterapia, primeiro concluído e publicado como resultado do convênio entre Anvisa e ONA. Oficializado na Resolução – RDC nº 75 daquele ano, o documento foi elaborado em conjunto pela ONA, pela Sociedade Brasileira de Hematologia e Hemoterapia (SBHH) e, inicialmente, pela Coordenação de Sangue do Ministério da Saúde, que posteriormente foi transferida para a Anvisa e se tornou, na época, a Gerência Geral de Sangue e Hemoderivados.²

Posteriormente, é lançada a primeira publicação destinada aos laboratórios: o Manual de Acreditação das Organizações Prestadoras de Serviços de Laboratórios Clínicos. A publicação é fruto de uma parceria Anvisa, ONA, Sociedade Brasileira de Análises Clínicas (SBAC) e Sociedade Brasileira de Patologia Clínica (SBPC), representantes do segmento. Além de passar por consulta pública, processo obrigatório para a elaboração de manuais da ONA, esse manual “foi submetido a um teste de campo, de 14 a 18 de julho de 2003, em 29 laboratórios clínicos localizados nas cinco regiões do país, que foram visitados por equipes de avaliadores das instituições acreditadoras e especialistas da área.³

Ainda dentro dos convênios com a Anvisa, em 2003 é lançado o Manual de Acreditação das Organizações Prestadoras de Serviços de Nefrologia e Terapia Renal Substitutiva, resultado de uma parceria com a Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN) e, como os anteriores, também foi submetido à consulta pública pela Anvisa (Consulta Pública nº 75, de 12 de setembro de 2002). Dessa vez, também colaboraram as Instituições Acreditadoras Credenciadas Instituto Paranaense de Acreditação em Serviços de Saúde (IPASS) e Instituto Qualisa de Gestão (IQG, hoje conhecido como IQG Health Services Accreditation)⁴.

O MANUAL BRASILEIRO de Acreditação em sua versão 2006.

A PARTIR DE 2010, os manuais da ONA foram consolidados em uma única versão.

O MANUAL BRASILEIRO de Acreditação lançado em 2014.

ATUAL EDIÇÃO DO MANUAL, lançada em 2018.

O processo de elaboração do manual voltado para nefrologia inovou ao incorporar elementos como:

  • a realização de uma Oficina de Trabalho patrocinada pela Anvisa, em Brasília, para discussão e ajustes na primeira versão do Manual redigida pela ONA e SBN. Foram dois dias de atividades, em 27 e 28 de agosto de 2002, com a participação de organizações que representam pacientes (Federação das Associações de Renais e Transplantados do Brasil – Farbra), prestadores de serviços de saúde (Associação Brasileira de Centros de Diálise e Transplante – ABCDT, Serviço de Nefrologia do Hospital São Rafael / Monte Tabor), instituições governamentais (Anvisa, Secretaria de Políticas de Saúde – SPS/MS, Conselho Nacional dos Secretários de Saúde – Conass, Vigilâncias Sanitárias Estaduais da Bahia, Paraná, Minas Gerais e Distrito Federal), entidades de classe (Sociedade Brasileira de Nefrologia – SBN, Sociedade Brasileira de Enfermagem em Nefrologia – SOBEN), além da ONA, do IQG e do IPASS.
  • a parceria com a Câmara Técnica de Vigilância Sanitária do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass), que participou do desenvolvimento do Manual, e de representantes das Vigilâncias Sanitárias Estaduais da Bahia, Paraná, Minas Gerais e Distrito Federal.

O teste de campo, feito por equipes de avaliadores das instituições acreditadoras e especialistas da área, ocorreu no período de 15 a 19 de setembro.

Os convênios também fizeram com que a ONA estreitasse parcerias com associações representativas de serviços específicos, como as já citadas SBAC, SBPC, SBHH e o Colégio Brasileiro de Radiologia, entre outras.

Em 2006, a ONA já havia lançado e agrupado seus manuais de acordo com os segmentos em que estavam inseridos: serviços de hemoterapia, laboratório clínico, nefrologia e terapia renal, hospitalares, radioterapia e serviços ambulatoriais. Em 2010, os manuais são consolidados em uma única publicação.

No mesmo ano, mais um marco: o Manual de Acreditação de Programas de Promoção da Saúde e Prevenção de Riscos e Doenças é aprovado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). “Acho que é um passo importante para a ANS, já que temos procurado várias formas de estímulo e, para a ONA, é um campo novo e que responde às preocupações contemporâneas”, disse na ocasião o presidente da ANS, Fausto Pereira dos Santos³.

Em 2011, os serviços adjacentes ao segmento de saúde como lavanderia, esterilização e reprocessamento de materiais, serviço de manipulação de drogas antineoplásicas e de dietas parenterais e serviços de dietoterapia, ganham publicação específica: o Manual para Avaliação e Certificação dos Serviços para a Saúde. Os serviços passam a ser certificados com o Selo de Qualificação ONA.

No ano seguinte, é a vez dos serviços odontológicos ganharem manual próprio, fruto de uma parceria da ONA com as Instituições Acreditadoras Credenciadas (IACs), a Faculdade de Odontologia da USP e a Associação Brasileira de Cirurgiões-Dentistas.

Em 2013, o manual consolidado recebe a chancela da International Society for Quality in Health Care (ISQua) e, no ano seguinte, é lançada a edição do manual certificada pelo órgão internacional. Entre as mudanças, está a incorporação dos conceitos da Classificação Internacional para Segurança do Paciente da Organização Mundial de Saúde (OMS).

A versão mais recente do manual, de 2018, foi novamente submetida e referendada pela ISQua. Na ocasião, Claúdio José Allgayer, presidente da ONA, agradeceu ao time responsável pela conquista e destacou que “Manter esse reconhecimento internacional traz um peso de grande relevo para o nosso trabalho. E nos mostra que estamos na direção correta”.³

ISQUA CERTIFICA acreditadoras que seguem padrões internacionalmente reconhecidos.

¹ NOVAES, Humberto Moraes de. História da acreditação hospitalar na América Latina – O caso Brasil. V.12 n.14. 2015. Disponível em: <https://revistas.face.ufmg.br/index.php/rahis/article/view/2693>.
² Ministério da Saúde. Manual de Acreditação de Serviços de Hemoterapia. Disponível em <http://www.anvisa.gov.br/servicosaude/acreditacao/manuais.htm#acoes>.
³ ONA. ANS aprova primeiro Manual de Acreditação de Programas de Promoção da Saúde e Prevenção de Riscos e Doenças. 2010. Disponível em <https://www.ona.org.br/Noticia/66/ANS-aprova-primeiro-Manual-de-Acreditacao-de-Programas-de-Promocao-da-Saude-e-Prevencao-de-Riscos-e-Doencas>.

Menu